Resumo: Propsito do Trabalho: Em O Investidor Inteligente Benjamin Graham propôs filtros que pudessem ser usados na identificação de ações subavaliadas. Como Graham sugeriu alguns critérios de forma bem objetiva para que as empresas sejam objeto de investimento, há ainda hoje a iniciativa de publicar estudos fazendo back tests, usando como base os parâmetros de indicadores financeiros estabelecidos e verificando se suas hipóteses de investimento ainda produzem retornos anormais superiores à média do mercado.
Como a adaptação e o entendimento desses filtros podem variar em cada estudo experimental de acordo com os pesquisadores, e possam também ter sido adaptados por estarem sendo aplicados ao mercado brasileiro (e não ao norte-americano, para onde foram concebidos) e um longo período após sua concepção (haja vista que a última edição de O Investidor Inteligente editada por Graham data de 1973), esse trabalho visa verificar dentre os filtros sugeridos por Graham (2007) e adaptados por Testa (2011) quais parecem ter sido os principais identificadores de empresas com performance superior à média de mercado no período analisado.
Como Testa (2011) aplicou os sete filtros sugeridos por Graham simultaneamente, não fica claro para o leitor quais deles podem ter sido mais relevantes e significativos para identificar empresas que entreguem valor superior no longo prazo. Assim, o objetivo desse trabalho será o de identificar quais dos critérios listados em O Investidor Inteligente (e adaptados por Testa, 2011) foram os que melhor identificaram companhias com bom potencial de valorização e, assim, mais agregaram valor à composição de uma carteira de investimentos.
Base da plataforma terica: A escola de pensamento de investimento em valor (ou, de sua origem, o value investing), tem na figura de Benjamin Graham (1894 – 1976) seu fundador. Através do livro Security Analysis, escrito conjuntamente com David Dodd em 1934, os autores e professores universitários definiram aqueles que seriam os alicerces de uma das principais escolas de pensamento em investimentos, sendo ainda hoje largamente usada na análise de investimentos.
Damodaran (2006) afirma que o que tornou o value investing notório ao longo dos anos foi o sucesso de seus praticantes. O mais eminente deles é Warren Buffett: o quarto homem mais rico do mundo de acordo com o ranking da revista americana Forbes em 2013 (com uma fortuna pessoal estimada em US$ 53,5 bilhões).
Browne (2008) menciona que dentre as maneiras para se ganhar dinheiro no mercado de ações, o investimento em valor é a estratégia que tem se mostrado mais eficaz ao longo dos anos. O investimento em valor é definido pelo mesmo autor como a compra de ações de empresas abaixo de seu valor intrínseco para conseguir lucrar com a performance a longo prazo. O autor ressalta o fato de que o investimento em valor não só funciona, mas tem produzido mais resultados do que outros métodos.
Posteriormente a Security Analysis, Graham escreveu um segundo livro buscando traduzir os conceitos do value investing para o público em geral: O Investidor Inteligente. Em ambas as obras, Graham versa sobre a necessidade de se buscar boas empresas que estejam sendo negociadas a preços considerados “descontados” de seus “valores justos” ou “valores intrínsecos”, e, portanto, constituam ótimas alternativas de investimento se corretamente analisadas.
Damodaran (2006) define que o objetivo dos investidores em valor é comprar participações em empresas cujo preço de mercado seja menor do que o valor de seus ativos existentes, buscando as melhores oportunidades em empresas mais maduras que não estejam na moda. Damodaran divide os investidores em valor em três perfis: (1) aqueles que praticam a filtragem passiva (foco de estudo desse trabalho); (2) os que realizam investimentos em valor contrário (quando são comprados ativos pelos quais o mercado não se interessa) e (3) os investidores ativistas, que são aqueles que adquirem um ativo e tentam intervir para forçar mudanças que aumentarão o seu valor.
Apesar de nas obras de Graham os aspectos subjetivos das empresas analisadas ganharem alguma relevância, Graham preocupou-se em instruir os investidores através de múltiplos contábeis e financeiros específicos que sintetizem a atratividade econômica do investimento nas empresas. Esses indicadores financeiros deram origem ao que foi posteriormente chamado na literatura de “filtros de Graham”, ou “filtros de valor”, e pretendem, conforme defendido por Graham, identificar de maneira objetiva as empresas que devem ser consideradas como alvos em potencial para um investimento em valor.
Os filtros definidos, de forma resumida, foram:
1. Tamanho adequado
2. Liquidez corrente maior ou igual a um no exercício encerrado
3. Nenhum prejuízo nos dez últimos anos
4. Dividendos ininterruptos durante, pelo menos, os últimos vintes anos
5. Crescimento mínimo do lucro de 30% nos últimos dez anos
6. Índice preço-lucro moderado (não pode ser maior do que 15)
7. O produto do P/L pelo P/VPA não deve exceder 22,50
Mtodo de investigao: Foi realizada uma pesquisa exploratória, com um estudo quantitativo dos dados verificando-se os índices financeiros das empresas listadas em bolsa, e, através de testes com e sem os filtros propostos por Graham (2007) e adaptados por Testa (2011), buscou-se verificar quais foram os atributos que melhor definiram o rol das empresas com desempenho superior à média do período analisado, e, dessa forma, direcionaram a performance das ações no mercado nacional.
Para tanto, foi observado na mesma data-base de Testa (2011) quais eram todas as empresas que atendiam os critérios estabelecidos por Graham nos dez anos antecedentes (conforme sugerido por Graham). Tendo sido estabelecido o portfólio de empresas que se enquadrava nesses critérios, foi posteriormente verificado seu desempenho pelos próximos dez anos e comparada a performance da carteira com o mercado como um todo (usando-se o Ibovespa como variável proxy).
Além disso foram realizadas simulações e testes tentando mapear quais foram os filtros que melhor identificaram ações de valor superior no mercado nacional no período, buscando assim definir quais foram os indicadores-chave que direcionaram o desempenho superior de determinada carteira. Isso foi feito através da simulação da seleção de ações fazendo-se uso de diversas combinações dos critérios definidos.
Nos resultados das carteiras teóricas, ao identificarmos empresas que satisfizessem os critérios impostos, foi mantida somente uma ação de cada empresa. Ademais, foram consideradas para as carteiras somente as dez ações mais líquidas. Cada uma das ações possui o mesmo peso (nessa caso, 10%) em cada um dos portfólios estudados nos períodos de verificação. Tendo-se em vista que o mercado brasileiro possui bem menos ações do que o norte americano, entendemos que um portfólio composto por dez ações seja suficientemente diversificado e passível de replicação mesmo que por pequenos investidores, ressaltando a aplicabilidade desse trabalho. Através da inclusão / exclusão de cada um dos filtros na montagem dos portfólios, e a comparação com o retorno que seria obtido pelo portfólio selecionado com a participação (ou não) dos filtros em análise, buscou-se compreender qual o impacto que cada filtro teve na seleção do portfólio, e, consequentemente, na performance da carteira.
Resultados, concluses e suas implicaes: O presente trabalho buscou analisar quais os fatores que melhor indicariam as empresas brasileiras que possuem características para apresentar retornos melhores do que a média do mercado. Por meio dos testes e análises realizados verificamos que o principal indicador capaz de denotar empresas com performance superior em bolsa é seu histórico de lucros positivos e consistentes ao longo dos anos. Isso vai ao encontro das ideias do value investing, que defende que para que uma empresa seja considerada como investimento atraente é importante que a mesma possua resultados constantes positivos, com um histórico razoavelmente longo e qualidade de gestão. Basicamente, todos atributos que denotam a empresa como sendo uma companhia de qualidade, que já tenha “provado seu valor” ao mercado e que apresente risco reduzido de desempenho futuro ao investidor (sobretudo um minoritário). Mirando companhias com esse perfil, um investidor poderia fazer seu investimento com tranquilidade quando o preço da companhia estivesse suficientemente convidativo (o que Graham busca medir através dos outros indicadores).
Assim, vemos que escolher empresas que possuam histórico de performance consistente e positivo é uma estratégia capaz de gerar valor acima da média de mercado também no ambiente brasileiro. Ou seja, companhias com um perfil de value investing de fato apresentaram performance superior à média do mercado no período analisado.
Ainda vale mencionar que outros três critérios (quais sejam, empresa de grande porte, liquidez corrente maior do que um e crescimento decenal mínimo do lucro de 30%) também apresentaram evidências de serem relevantes na montagem de um portfólio de ações no mercado brasileiro, agregando valor e mostrando-se importantes identificadores de empresas com perfil capaz de entregar valor superior no período de verificação.
Ademais, observamos que tanto o critério do pagamento de dividendos no ano em análise, quanto o critério de um nível convidativo de relação entre preço da ação, seu respectivo lucro e valor patrimonial, se usados isoladamente não foram capazes de trazer ganhos acima da média de mercado para a carteira. Além disso, em uma carteira montada com todos os demais critérios, a inutilização de ambos os critérios, mesmo que simultaneamente, não se refletiu em alterações da carteira, mantendo a performance inalterada. Concluímos assim que esses critérios são irrelevantes para a montagem de uma carteira de investimentos. Os motivos da irrelevância desses fatores podem estar calcados em sua baixa seletividade (o critério de pagamento de dividendos no ano em análise é bem menos restritivo do que o proposto por Graham (2007)), e as qualidades das empresas que teoricamente seriam indicadas pelo critério de um nível convidativo entre preço e valor patrimonial poderiam já estar implícitas nos demais filtros (como, por exemplo, o filtro que limita a relação preço-lucro das ações selecionadas).
No que diz respeito ao critério de baixos índices preço-lucro na data de análise, nossos resultados não foram claramente objetivos. Vimos que se usado isoladamente esse filtro destrói valor na seleção de ativos, no entanto, ao tentarmos simplificar a seleção de ações, excluindo os filtros entendidos como irrelevantes, esse filtro ganha relevância, possuindo assim alguma expressividade na montagem do portfólio, ainda que de importância secundária. Dessa maneira, concluímos que esse filtro também agregue valor e deva ser considerado quando da montagem de um portfólio de ações no mercado nacional.
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