Resumo: Propsito do Trabalho: O International Accounting Standard Board (IASB) emitiu em 2011 a International Financial Reporting Standard (IFRS) 11 – Joint Arrangements, a qual foi recepcionada no Brasil pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) mediante o Pronunciamento Técnico CPC 19 – Negócios em Conjunto, alterando assim o tratamento contábil na forma de reconhecimento dos investimentos em Joint Ventures ou Empreendimentos Controlados em Conjunto (ECC) pelas companhias abertas brasileiras (Mackenzie, Coetse, Njikizana, Chamboko, Colyvas & Hanekom, 2013).
Neste cenário, desde a adoção das IFRS pelo país em 2007, por meio da Lei 11.638, a CVM permitiu o reconhecimento de ECC por ambos os métodos – Consolidação Proporcional (CP) ou Método de Equivalência Patrimonial (MEP). Contudo, após a Deliberação CVM nº 694 de 2012, as companhias abertas brasileiras também passaram a reconhecer os seus ECC a partir de 2013, utilizando somente o MEP (CPC 18, 2012; Deliberação CVM nº 694, 2012).
Assim, tendo como enfoque o contexto do Brasil, em que se permitia o uso de ambos os métodos de reconhecimento de ECC, e atualmente restringe-se à utilização do MEP, o presente estudo tem como objetivo analisar se algumas características relacionadas às companhias abertas brasileiras listadas na BM&FBOVESPA influenciaram a escolha do método empregado por elas no reconhecimento de seus ECC, quando essa opção ainda estava disponível pelo CPC e CVM.
Como principais contribuições, espera-se que esta pesquisa amplie a base teórica relacionada às escolhas contábeis no que concerne ao reconhecimento de ECC, permita a avaliação do impacto da nova norma para as empresas que reconheciam os ECC pelo método da CP e fomente a discussão acerca da busca da comparabilidade pleiteada pelo IASB versus a representação fidedigna.
Base da plataforma terica: De acordo com Lourenço e Curto (2010), o reconhecimento de ECC tem gerado dissenso internacional em órgãos normatizadores como o IASB, quanto ao melhor método a ser utilizado nesses investimentos.
Richardson, Roubi e Soonawalla (2011) mencionam também que os debates envolvendo os métodos de reconhecimento em ECC, se desenvolvem no sentido de compreender se os investidores realmente controlam o investimento e se eles seriam os responsáveis pelos respectivos passivos assumidos no negócio.
Lourenço e Curto (2010) ainda comentam que os opositores à CP, afirmam que os empreendedores não possuem controle sobre a parcela de ativos e passivos do negócio firmado em conjunto, portanto, o MEP seria o mais indicado para a contabilização desses investimentos.
Não obstante, esses autores encontraram evidências em suas pesquisas, que as empresas do Reino Unido que estiveram mais propensas a utilização da CP, foram aquelas que apresentaram alta alavancagem, e que o tipo de acordo firmado entre as partes – escala ou linha – influencia diretamente na definição do método empregado (Lourenço & Curto, 2010).
Richardson et al. (2011), encontrou que as empresas canadenses que utilizavam o MEP em seus ECC, experimentaram um declínio na relevância da informação dos seus ativos e passivos, quando essas empresas foram obrigadas a utilizar somente o método da CP.
Deste modo, esse estudo contrariou pesquisas anteriores, que haviam evidenciado que a utilização da CP forneceu informações mais relevantes para os investidores no cenário canadense do que pelo MEP, num contexto em que as empresas apresentaram maior compartilhamento de negócios em projetos de exploração e desenvolvimento.
Com relação às escolhas contábeis, Watts (1992) definiu que correspondem à decisão de um gestor pela utilização de um método contábil em oposição a outro, afirmando, porém, que é necessário conhecer as razões que levaram àquelas escolhas contábeis.
As escolhas contábeis podem ainda afetar a situação econômico-financeira de uma empresa, mesmo que essa escolha represente fidedignamente um fenômeno econômico, de acordo com as IFRS (Barth, Landsman, & Lang, 2008; CPC 00, 2011).
Em razão da discricionariedade permitida por essas normas, algumas escolhas podem levar à prática de gerenciamento de resultados, que para Lo (2008), consiste na utilização de julgamentos para influenciar ou enganar os stakeholders.
Nesse sentido, Fields, Lyz e Vincent (2001) defendem que os órgãos reguladores precisariam compreender quais são os benefícios de se permitir escolhas contábeis, e qual o nível de discrição inerente a cada uma delas. Porém, Barth et al. (2008), afirmam que a qualidade da informação contábil seria melhorada se os órgãos normatizadores reduzissem o número de escolhas previstas nos PCGA.
Além dos trabalhos que abordam a influência do gestor relativo às escolhas contábeis na utilização de um método contábil (Watts, 1992), ou ainda, a interferência dos órgãos reguladores acerca das escolhas contábeis (Fields et al., 2001; Barth et al., 2008), Lorencini e Costa (2012) relacionaram alguns fatores que podem determinar as escolhas contábeis, tais como: nível de governança corporativa, influência de auditoria por Big Four, participação dos administradores nos lucros, emissão de American Depositary Receipt (ADR), tamanho do ativo diferido, reavaliação de bens do ativo imobilizado e endividamento, encontrando que apenas o nível de governança corporativa e o saldo do ativo diferido influenciaram as escolhas contábeis das empresas brasileiras pesquisadas.
Mtodo de investigao: Para a coleta de dados, foi acessada a página da BM&FBOVESPA, e para a definição da amostra foi verificado se as empresas listadas participavam em algum nível de governança corporativa, que a sua atividade principal não se restringe-se a participação em outras sociedades, não pertencessem ao setor financeiro e não apresentassem Brazilian Depositary Receipts (BDRs). Atendido a esses critérios, foram selecionadas somente as companhias listadas na bolsa de valores brasileira que apresentassem ECC. Na sequência foram analisadas suas notas explicativas, pareceres dos auditores e as demonstrações contábeis de 2012, por corresponder ao último exercício social em que as companhias abertas poderiam utilizar o método da CP ou o MEP.
Para a análise das características das entidades que pudessem ter influenciado a escolha dos gestores pelo método da CP ou do MEP, utilizou-se dos fatores previstos no estudo de Lorencini e Costa (2012), cujas variáveis selecionadas foram as seguintes: nível de governança corporativa, auditoria por Big Four, participação dos administradores nos lucros, endividamento, tamanho da companhia e setor de atuação como variável adicional.
A análise da influência das variáveis na escolha dos gestores foi feita por meio de uma regressão logística, posto que a variável dependente (ECC) comporta apenas dois valores, o que torna necessária a utilização de modelos de escolha qualitativa binária, como o modelo Logit e Probit. Foram realizadas simulações estatísticas, a fim de se avaliar qual dos dois modelos melhor se adequaria aos dados desta pesquisa. Os resultados das estatísticas do modelo Probit apresentaram-se mais significativas, portanto, foi o modelo utilizado nessa pesquisa.
Buscou-se interpretar os resultados da regressão logística por meio dos efeitos marginais, por permitirem avaliar o impacto na probabilidade das entidades optarem pelo MEP, em decorrência de alterações nas variáveis independentes.
Os ajustes do modelo foram avaliados por meio de três testes: (a) o teste Hosmer-Lemeshow, para verificar se existe diferenças significativas entre as frequências observadas e as frequências previstas; (b) a tabela de classificação, a fim de examinar o percentual de acerto do modelo e as medidas de sensitividade e especificidade; e (c) a curva Receiver Operating Characteristic (ROC).
Resultados, concluses e suas implicaes: Os resultados da pesquisa mostram que houve uma relativa predominância pela escolha da CP no ano de 2012, em que 54,11% das empresas optaram pela utilização deste método, frente a 45,89% que utilizaram o MEP. Esses percentuais delineiam o impacto que a adoção da IFRS 11 teve nas empresas brasileiras em 2013, com mais da metade das empresas tendo de alterar a sua prática contábil no reconhecimento de ECC.
Quanto à verificação se o setor de atuação da companhia interfere na escolha do método de reconhecimento de ECC, tem-se que os parâmetros do setor de petróleo, gás e biocombustíveis (SET6) não foram estimados, em virtude de apenas uma entidade desse setor compor a amostra. Essa companhia optou pelo método da CP. Em relação aos setores de atuação com parâmetros estimados, percebe-se que nenhum setor apresentou indicadores significativos. Em outras palavras, o fato de a empresa pertencer a um determinado setor de atuação não influencia as decisões dos gestores, ou seja, não aumenta e nem diminui a probabilidade de que ela opte pelo MEP.
No que diz respeito aos níveis de governança corporativa, apenas o Bovespa Mais (NGC1) trouxe indícios de influenciar as decisões dos gestores quanto ao reconhecimento de investimentos. A um nível nominal de significância de 10%, o fato de a entidade pertencer ao Bovespa Mais, reduz em 36,58% a probabilidade de que ela escolha o MEP.
Pelo fato de apenas três entidades não remunerarem seus gestores por meio de participação nos lucros, a variável PAL foi omitida pelo software stata® e, portanto, também não obteve seus indicadores aferidos.
Ao se observar se as variáveis: big four, tamanho da empresa e endividamento interferem nas decisões dos gestores, constatou-se que apenas o tamanho da companhia apresentou resultados estatisticamente significativos. Isso denota que: a um nível nominal de significância de 5%, há indícios de que o tamanho do ativo aumenta consideravelmente a probabilidade de a entidade optar pelo MEP ao reconhecer seus investimentos.
Assim, não se pode inferir que o endividamento influenciou a escolha pela CP no cenário brasileiro, diferentemente dos resultados encontrados no estudo de Lourenço e Curto (2010) para as empresas do Reino Unido.
Não obstante, essa pesquisa avançou em relação ao estudo de Lorencini e Costa (2012) ao revelar, por meio dos testes estatísticos, que, a participação em algum dos níveis de governança corporativa e o tamanho da companhia podem ser considerados como indicadores das escolhas contábeis pelas companhias brasileiras. Ademais, avançou em relação àquela pesquisa ao constatar que o setor de atuação não interfere na escolha contábil do gestor em relação ao reconhecimento de ECC.
Cabe salientar, contudo, que os resultados deste trabalho foram tratados como indícios, em virtude do número limitado de entidades analisadas. Sugere-se para futuras pesquisas, que se analisem as escolhas contábeis referentes ao reconhecimento de investimentos de todas as companhias abertas brasileiras, para o período de 2012, a fim de confirmar os resultados aqui encontrados. Recomenda-se, também, o estudo da relevância da informação dos demonstrativos contábeis publicados em 2013, quando as companhias abertas brasileiras foram obrigadas a utilizar somente o MEP no reconhecimento de ECC.
Referncias bibliogrficas: Bauman, M. P. (2007). Proportionate consolidation versus the equity method: additional evidence on the association with bond ratings. International Review of Financial Analysis,16(5), p. 496-507.
Fields, T. D., Lys, T. Z., & Vincent, L. (2001). Empirical research on accounting choice. Journal of Accounting and Economics, 31, p. 255-307.
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Jaafar, A., & Mcleay, S. (2007). Country Effects and Sector Effects on the Harmonization of Accounting Policy Choice. ABACUS, 43(2).
Lorencini, F. D., & Costa, F. M. (2012). Escolhas Contábeis no Brasil: identificação das características das companhias que optaram pela manutenção versus baixa dos saldos do ativo diferido. Revista Contabilidade e Finanças, 23(58), p. 52-64.
Lourenço, I. C., & Curto, J. D. (2010). Determinants of the accounting choice between alternative reporting methods for interests in jointly controlled entities. European Accounting Review, 19(4), p. 739-773.
Richardson, A. W., Roubi, R. R. & Soonawalla, K. (2012). Decline in financial reporting choice. European Accounting Review, 21(2), p. 373-393.
Watts, R. L. (1992). Accounting choice theory and market-based research in accounting. British Accounting Review, 24, p. 235-267.
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