Resumo: Propsito do Trabalho: Nos últimos anos, as principais economias ocidentais foram balançadas pelo aprofundamento de crises financeiras, tendo maior visibilidade falências bancárias e a maciça intervenção estatal para salvar instituições financeiras em dificuldade. No contexto da crescente turbulência econômica, no Brasil muitas empresas tiveram perdas significativas ao negociar mais opções do que o necessário para assegurar suas operações (se “hedgear”).
Ott e Gonçalves (2002) ressaltam em sua pesquisa sobre evidenciação nas Companhias Brasileiras de Capital Aberto que um dos temas de grande interesse para os teóricos da contabilidade ao longo dos tempos diz respeito ao processo de divulgação das informações sobre a gestão das empresas aos usuários externos. A esse processo, dá-se o nome de evidenciação (disclosure).
Neste contexto, o monitoramento das informações financeiras pelos auditores independentes é um instrumento para reduzir a assimetria da informação; e o custo de transações entre as empresas e os usuários das demonstrações contábeis, esclarecendo os riscos financeiros que as empresas podem estar submetidas.
O objetivo desta pesquisa é investigar a qualidade da auditoria independente realizada em empresas com grandes perdas com instrumentos financeiros derivativos, a fim de analisar a importância do conteúdo das opiniões dos auditores independentes. Adicionalmente, visa estimular o debate sobre a qualidade da auditoria independente, analisando os relatórios de auditoria emitidos sobre as demonstrações contábeis de empresas com grandes perdas financeiras no mercado de opções com instrumentos derivativos.
Base da plataforma terica: Auditoria Externa e seu Papel na Governança Corporativa no Contexto da Teoria da Agência
Neste artigo procura-se construir um percurso da teoria do agenciamento ao papel da auditoria externa no desenho da governança corporativa. Assim, segundo Lustosa (2004), as boas regras de governança corporativa visam justamente diminuir o risco de abuso de poder por parte de executivos ou dos controladores. Para tanto, é necessário um conjunto de medidas que tentem aproximar os interesses dos insiders e outsiders, reforçando mecanismos que garantam equidade, transparência e accountability.
Segundo Martinez (1998), no contexto da Agency Theory (Teoria da Agência), a contabilidade e a auditoria transformam-se em instrumentos de monitoramento, validação e preservação das relações contratuais. Assim, os relatórios contábeis e os pareceres de auditoria são os meios pelos quais as partes contratantes mensuram e monitoram a execução dos objetivos contratuais.
Neste sentido, pode-se destacar, baseando-se nas afirmações de Zimmerman (1997), que o principal pode criar mecanismos que incentive a uma convergência de objetivos. A alocação de custos e a auditoria são dois dos mecanismos contábeis utilizados para resolver os problemas de agência. Ao seguir a lógica teórica, a área de gerenciamento de risco, geralmente, pode fornecer subsídios para que a contabilidade possa elaborar notas explicativas demonstrando a exposição aos riscos, que por sua vez serão auditadas externamente para se verificar se não houve incorreção ou omissão.
Qualidade da Auditoria Independente
Segundo Francis (2004), os auditores desempenham um papel importante para assegurar a produção e emissão de relatórios financeiros de alta qualidade. Entretanto, ultimamente, tem-se dado muita atenção à eficacia do papel da auditoria em termos da garantia da credibilidade da informação contábil, em razão da onda de falências no início do milênio, exemplificada pela queda da Enron em 2001 e pelo colapso da Arthur Andersen em 2002. Esses episódios desencadearam uma série de críticas em relação à qualidade e aos processos de realização das auditorias pelas firmas de auditoria denominadas de Big 4. Neste sentido, essas críticas têm provocado um grande impacto no mercado de auditores, tendo em vista, particularmente, a percepção tradicional de alta qualidade das auditorias realizadas por grandes empresas.
Nessa perspectiva, é interessante traçar um perfil da qualidade da auditoria na literatura contábil, assim conforme DeAngelo (1981) ela pode ser definida como a probabilidade de um erro ou irregularidade ser detectado. Ao complementar esta definição Bradshaw e outros, (2001) acrescentam a disposição em relatar quaisquer manipulações ou erros materiais que possam aumentar incertezas substanciais ou problemas de continuidade. Em outras palavras, segundo Palmrose (1988) uma elevada qualidade da auditoria está associada à ausência de omissões ou erros materiais nas demonstrações financeiras.
Instrumentos Financeiros Derivativos e Gerenciamento de Riscos
Os Instrumentos financeiros derivativos, conforme Lopes e Lima (2001), dentro de uma definição ampla, são contratos que têm o seu valor derivado de um ativo base que não o próprio contrato. Ainda, na opinião de Lopes e Lima (2001), os instrumentos financeiros vêm revolucionando o mercado financeiro internacional como excelentes mecanismos de proteção e especulação frente ao risco de mercado (flutuação de preços e taxas) e outros riscos que vem se desenvolvidos ao longo do tempo.
Mtodo de investigao: Esta pesquisa procura analisar a qualidade da auditoria independente, sendo um dos passos, verificar as solicitações de reapresentação das demonstrações financeiras por exigência da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) acarretadas por perdas financeiras significativas por exposição a risco com instrumentos financeiros derivativos. A partir daí, analisar as opiniões dos auditores independentes e verificar se elas indicavam a exposição material ao risco.
Assim, este artigo procura investigar os seguintes pressupostos, como sinal de baixa qualidade da auditoria:
- Na opinião do relatório de auditoria imediatamente anterior ao evento de divulgação de perdas, há indicativo, por meio de ressalva ou de parágrafo de ênfase, que a empresa estava exposta a risco material de perdas com instrumentos financeiros derivativos.
- Na opinião do relatório de auditoria imediatamente anterior a exigência de refazimento e reapresentação de Demonstrações Financeiras ou Informações Trimestrais - ITR’s, referente à exposição ao risco associado à operação com instrumentos financeiros derivativos, há indicativo, por meio de ressalva ou de parágrafo de ênfase, que a empresa não divulgava de forma adequada a sua exposição a risco significativo com instrumentos financeiros derivativos.
Nos pressupostos acima, em caso afirmativo, teríamos um sinal de qualidade da auditoria, em caso negativo teremos indícios de baixa qualidade do relatório de auditoria.
Para construção da amostra das empresas com perdas significativas em instrumentos financeiros derivativos, utilizou-se das manchetes nos principais sites e jornais com assuntos de economia e finanças.
Na composição da amostra das empresas com exigência de refazimento e reapresentação de Demonstrações Financeiras ou Informações Trimestrais - ITR’s, referente à exposição ao risco associado à operação com instrumentos financeiros derivativos; é realizada uma pesquisa documental, através de consulta no site da CVM até o dia 31 de Janeiro de 2014, contemplando uma análise que se inicia com a solicitação de refazimento a partir do dia 21 de Janeiro de 2001. Desta forma, efetua-se uma análise de conteúdo dos Ofícios de Determinação de refazimento das Informações Trimestrais - ITR’s das Companhias.
Resultados, concluses e suas implicaes: O aprofundamento de crises financeiras e a exposição ao risco, com grandes perdas decorrentes de instrumentos financeiros não evidenciadas nas demonstrações financeiras colocam em questão o papel e a credibilidade da auditoria externa. O mercado parece ficar intranquilo e inseguro em relação a relatórios e pareceres de auditores sem restrições sobre eventos relevantes e iminentes.
Esta pesquisa objetivou investigar a qualidade da auditoria independente realizada em empresas com grandes perdas com instrumentos financeiros derivativos. Para tanto, desenvolveu-se um estudo empírico em que se utiliza como proxy o parecer de auditoria de empresas cadastradas no sitio da CVM, a fim de verificar a opinião dos auditores a respeito de grandes exposições aos riscos com instrumentos derivativos.
Em relação ao primeiro pressuposto, verificou-se que, das 17 empresas com perdas significativas com instrumentos financeiros derivativos identificadas (tabela 3), por meio de manchetes nos principais sites e jornais com assuntos de economia e finanças, 16 empresas brasileiras de capital aberto estavam cadastradas no sítio da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Assim, a análise da opinião dos auditores independentes (tabela 2) foi realizada com base nas publicações das demonstrações financeiras na data-base de 30 de junho de 2008 e 31 de dezembro de 2007 coletadas no site da CVM. Com base na análise, verificou-se que as companhias receberam do auditor um relatório de auditoria sem ressalva; ou com ressalva ou com parágrafo de ênfase que não indicava a exposição a riscos com instrumentos financeiros derivativos.
Em relação ao segundo pressuposto (tabela 2), verificou-se que apesar de algumas companhias ter recebido do auditor um relatório de auditoria relatório de auditoria sem ressalva; ou com ressalva ou com parágrafo de ênfase que não se referiam à exposição a riscos com instrumentos financeiros derivativos, houve exigência de refazimento e reapresentação do formulário ITR do 3º trimestre de 2008 (30.09.2008), referente à exposição ao risco associado à operação com instrumentos financeiros derivativos. Desta forma, a tabela 2 contempla as Companhias analisadas neste artigo, que tiveram ofício da CVM, determinando o refazimento e reapresentação do formulário ITR, referente ao 3º trimestre de 2008 por conta de Instrumentos Financeiros Derivativos.
A pesquisa revelou um indício claro da baixa qualidade das auditorias realizadas, ao se notar que apesar de a companhia receber um parecer ou relatório de revisão dos auditores independentes sem restrições sobre as Demonstrações Financeiras e Informações Trimestrais, respectivamente, houve perdas significativas com instrumentos financeiros derivativos cuja exposição aos riscos não foi evidenciada.
Outro indício de baixa qualidade das auditorias realizadas é observado quando não há referência à exposição a riscos com instrumentos financeiros derivativos, quando há a exigência de refazimento e reapresentação demonstrações, referente a este fato.
Neste sentido, os auditores que, através de sua atividade, estabelecem-se como instrumentos para persuadir a sociedade de que os gestores e corporações capitalistas não são corruptos; e que as empresas e os seus administradores são transparentes, têm deixado de alertar, com base nas evidências desta pesquisa, ao mercado, sobre situações de riscos iminentes, tendo em vista que as exposições correspondentes ficam omitidas.
É bom esclarecer, entretanto, que ao ocorrerem perdas significativas de mercado, o custo social e econômico, quase sempre, é muito alto, exigindo dos órgãos reguladores uma postura mais agressiva. Os episódios apontados nesta investigação, portanto, incentivam uma reflexão sobre o papel, valor e independência dos auditores, apresentando também oportunidades de investigação em matéria de regulação, independência, processo político, realização dos trabalhos e a base de conhecimentos dos auditores.
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DeAngelo, L. 1981. Auditor size and auditor quality. Journal of Accounting and Economics 3 (December): 183-199.
Francis, J. R. (2004). "What Do We Know About Audit Quality?", The British Accounting Review, 34(4): 345-368.
GONÇALVES, Odair ; OTT, E. . A evidenciação nas companhias brasileiras de capital aberto. In: XXVI ENANPAD, 2002, Salvador. Anais do XXVI ENANPAD. Rio de Janeiro : ANPAD, 2002.
LOPES, A. B. ; LIMA, Iran Siqueira . Perspectivas para a Pesquisa em Contabilidade: o Impacto dos Derivativos. Revista Contabilidade & Financas, São Paulo, v. 15, p. 25-41, 2001.
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ZIMMERMAN, Jerold. Accounting for decision making and control. Boston: Irwin, 1997.
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