Resumo: Propsito do Trabalho: Com vistas a atrair a atenção do aluno com uma ferramenta tecnológica, o objetivo geral do trabalho foi avaliar empiricamente a efetividade em ensinar o modelo de Richard Paul, via ambiente virtual de aprendizagem (Moodle), em alunos do ensino superior, especificamente, em alunos de uma disciplina contábil. A escolha de uma disciplina da área contábil foi devido à formação do pesquisador e à intenção de comparação com o trabalho de Passos (2011), que em sua tese obteve resultados positivos no desenvolvimento de raciocínio crítico em alunos da área. O autor citado justificou a escolha explicando que a internacionalização e harmonização das Normas Contábeis Brasileiras, após a aprovação da lei 11.638/07 (Nova Lei das Sociedades Anônimas), aumentou a demanda por profissionais contábeis com maiores níveis de raciocínio crítico. Sendo assim, os objetivos específicos deste trabalho foram:
1. Intervir com o modelo de Richard Paul via Moodle em uma turma experimento e com pré-testes e pós-testes analisar, comparando com uma turma controle, se o modelo conseguiu desenvolver o raciocínio crítico dos alunos; e
2. Comparar os resultados com estudos anteriores, em especial o de Passos (2011), Passos et al. (2013) e Reed (1998).
Baseado no exposto e em pesquisas anteriores (Passos et al. (2013); Passos (2011); Quitadamo et al. (2008); Abrami et al. (2008); Cornacchione, Duncan e Johnson (2007); Braun (2004); Wilson (2002); Pithers e Soden (2000); Allen et al. (1999); Reed (1998); Bonk e Smith (1998); Baril et al. (1998)) este trabalho possui a seguinte questão de pesquisa: Existe relação entre a aplicação do modelo de Richard Paul em ambientes virtuais de aprendizagem e o desenvolvimento de habilidades de raciocínio crítico em alunos de disciplinas contábeis?
Base da plataforma terica: Nos Estados Unidos da América a literatura que trata do tema Critical Thinking, termo neste trabalho traduzido como Raciocínio Crítico, é vasta e o assunto é estudado há décadas. Não há consenso no Brasil sobre a tradução do termo, encontrando-se muitas palavras para seu significado, como, por exemplo: Pensamento Crítico, Pensando Criticamente, Argumentação Lógica, Raciocínio Lógico etc.
As definições muito se assemelham, constata-se que existe consenso em relação ao raciocínio crítico ser um pensamento organizado, envolver julgamento e analisar as argumentações e fatos apresentados sobre um objeto discutido.
Em 2008, uma meta-análise identificou e resumiu as evidências empíricas disponíveis em 117 estudos abrangendo 20.698 participantes sobre o impacto de intervenções no desenvolvimento das habilidades ou atitudes de raciocínio crítico dos alunos. Esse trabalho concluiu que o tipo de intervenção e metodologia de ensino está relacionado com os níveis de desenvolvimento de raciocínio crítico. Com esta pesquisa, tornou-se evidente que o aprimoramento ou desenvolvimento das habilidades ou atitudes de raciocínio crítico dos alunos não podem ser uma mera expectativa implícita dos projetos pedagógicos e educadores (ABRAMI et al, 2008).
Em 2007, um artigo publicado na área contábil no Brasil explorou, em uma amostra de 65 estudantes de graduação e pós-graduação em Ciências Contábeis da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), as habilidades de raciocínio crítico, leitura e escrita. Por meio de análises estatísticas, o estudo focou os elementos para a melhoria do desempenho dos estudantes em relação as suas habilidades de raciocínio crítico. Este trabalho refletiu sobre o papel dos educadores como agentes de mudanças no cenário da educação superior (CORNACCHIONE; DUNCAN; JOHNSON, 2007).
Em 1998, Jennifer H. Reed defendeu sua tese que investigou a aplicação do modelo de Richard Paul para desenvolvimento de raciocínio crítico em um curso de História Norte Americana. O objetivo da intervenção foi desenvolver: habilidades para pensar criticamente sobre História Norte Americana e sobre assuntos diários; atitudes para pensar criticamente; e conhecimento sobre o conteúdo de História Norte Americana. A pesquisa examinou também se a idade ou gênero influenciava a eficiência do método de instrução (REED, 1998).
Passos (2011) e Passos et al. (2013) continuaram o trabalho de Reed (1998) e aplicaram o modelo de desenvolvimento de raciocínio crítico de Richard Paul em alunos de disciplinas contábeis.Em uma instituição de ensino superior pública não constataram efeito significativo do modelo no desenvolvimento de habilidades ou atitudes de raciocínio crítico e nenhuma diferença considerando o efeito isolado das variáveis idade ou gênero. Em uma instituição particular foram confirmadas duas hipóteses: a turma experimento (p = 0,040 e d = 0,56) e os alunos mais velhos (p = 0,047 e d = 0,58) apresentaram maior desenvolvimento de habilidades de raciocínio crítico. Apesar de as médias das atitudes não terem sido significativamente diferentes, encontraram também efeito significativo do modelo instrucional no desenvolvimento da atitude curiosidade (p = 0,047 e d = 0,65). Também constataram diferenças significativas nas habilidades para os efeitos isolados de idade (p = 0,002 e d = 0,77) e gênero (p = 0,016 e d = 0,60); e para as atitudes no efeito isolado do gênero (p = 0,033 e d = 0,46).
Mtodo de investigao: O trabalho aplicou um protocolo de pesquisa semelhante aos de Reed (1998), Passos (2011) e Passos et al. (2013) com pré-testes e pós-testes avaliando habilidades de raciocínio crítico. Primeiramente análises descritivas e correlações dos dados demográficos e acadêmicos dos alunos foram realizadas para verificar possíveis variáveis que poderiam explicar as diferenças dos desempenhos entre as classes. Como não foi possível sortear cada aluno para o grupo experimento e sim a classe como um todo, a pesquisa foi classificada como um quase experimento (BICKMAN; ROG, 1998).
O modelo de Richard Paul para desenvolvimento de raciocínio crítico foi ensinado via Moodle e aplicado para a classe experimento, a outra classe do mesmo semestre e disciplina recebeu um método tradicional de ensino. As intervenções assíncronas na turma experimento foram semanais e em noventa por cento dos casos via ambiente virtual de aprendizagem, pois na maioria das vezes um breve fechamento da atividade era realizado presencialmente e sempre um incentivo para a média final era utilizado. Utilizaram-se textos jornalísticos, artigos científicos, capítulos de livros e situações problema para debates utilizando o modelo de raciocínio crítico de Richard Paul. Foram aplicados pré-testes ao início da terceira semana de aula e pós-testes ao final do semestre para avaliar as habilidades de raciocínio crítico dos alunos (EWCTET).
O Ennis-Weir Critical Thinking Essay Test (EWCTET) foi aplicado para avaliar a habilidade dos estudantes em analisar um argumento e responder criticamente por escrito um assunto em questão. Este instrumento avalia a habilidade de responder a argumentos quando eles aparecem naturalmente em uma discussão, disputa ou debate do mundo real (ENNIS; WEIR, 1985; CORNACCHIONE, DUNCAN; JOHNSON, 2007; REED, 1998; PASSOS, 2011; PASSOS et al., 2013).
A análise estatística buscou testar diferenças significativas entre as duas classes, a ideia inicial era utilizar a Análise de Covariância (ANCOVA) considerando os pré-testes como covariáveis. Porém, como a ANCOVA é um teste estatístico paramétrico e uma das turmas apresentou os escores com diferença significativa de uma distribuição normal, optou-se por utilizar três testes não paramétricos: o teste de Mann-Whitney; o teste da soma dos postos de Wilcoxon e o teste dos postos com sinais de Wilcoxon (FIELD, 2009).
Resultados, concluses e suas implicaes: O principal resultado desta pesquisa respondeu seu problema: os alunos da turma experimento não se saíram melhor do que os alunos da turma controle em um teste que avalia habilidades de raciocínio crítico. Logo, pode-se dizer que o modelo de Richard Paul não teve efeito significativo no desenvolvimento de habilidades de raciocínio crítico quando aplicado em uma abordagem mista e via ambiente virtual de aprendizagem Moodle.
Refletindo sobre as ideias de Lipman (2003), pensar significa a possessão de um conceito, uma opinião ou uma crença, e isso não implica o uso de bom julgamento. Qualquer pensamento que envolve critério, comparação e se baseie em padrões é raciocinar. O modelo de raciocínio crítico aplicado na turma experimento via Moodle pretendeu incentivar os alunos a utilizarem critérios e padrões para pensar sobre determinado objeto de estudo (artigo, livro, problema etc.).
A aplicação do modelo de desenvolvimento de habilidades de raciocínio crítico de Richard Paul em uma abordagem mista, explicando como utilizar o modelo e aplicando em diversas atividades durante um semestre já obteve resultado positivo em pesquisas anteriores (PASSOS, 2011; REED, 1998; ABRAMI et al, 2008), porém via um ambiente virtual de aprendizagem não se encontrou uma prévia investigação. Uma das possíveis explicações para o resultado negativo pode ser atribuída à baixa intensidade das aplicações, fato que não foi observado via ambiente virtual de aprendizagem nas atividades assíncronas e que desperta interesse para possíveis maneiras de seu controle em futuros trabalhos.
Analisando os dados das duas turmas em busca de prévias diferenças das habilidades de raciocínio crítico, verifica-se que o percentual de cada turma que optou em participar da pesquisa e a variável gênero compõe a lista de possíveis limitações do presente estudo.
Esta investigação se justifica por dar continuidade ao tema, às pesquisas anteriores e pela inserção da variável ambiente virtual de aprendizagem como um atrativo aos alunos das novas gerações. Esta pesquisa contribui para o aumento da discussão sobre diferentes metodologias, ferramentas e recursos que possam ao mesmo tempo melhorar o aprendizado do aluno e desenvolver habilidades requeridas pelo mercado profissional e acadêmico.
Para futuras pesquisas se sugere amostras maiores, tornando possível melhorar o poder estatístico dos resultados e a investigação de formas de controle que intensifiquem o tempo de dedicação dos alunos nas atividades assíncronas (via ambiente virtual de aprendizagem). Devido aos resultados dos testes de alunos de instituições particulares terem ficado bem abaixo das universidades internacionais e brasileiras públicas, sugere-se que futuras investigações considerem a variável tipo de instituição (pública versus particular). Sugere-se também, que futuras pesquisas apliquem o modelo em cursos de graduação ou pós-graduação em diferentes abordagens (Geral, Infusão, Imersão ou Mista) e com diferentes ambientes virtuais de aprendizagem, ferramentas e recursos tecnológicos, como por exemplo: jogos de empresas, tablets, celulares, fóruns de discussão, quizzes etc. (ENNIS, 1993).
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