Resumo:
Propsito do Trabalho:
Instrumentos regulatrios que versem sobre a disponibilizao de informaes se apresentam como importantes ordenamentos jurdicos para transformaes no modelo de gesto dos rgos pblicos e no modo de comunicao do poder pblico com os diversos atores sociais. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) de 2000, a Lei da Transparncia de 2009 e a Lei de Acesso Informao (LAI) de 2011 so exemplos de instrumentos que surgiram como respostas s demandas e presses da sociedade para a consolidao da democracia no Brasil. Estas leis tm como princpio basilar o direito de acesso s informaes do Estado pela sociedade em todos os seus rgos e poderes. O direito informao como regra uma condio mnima para o engajamento social na vida poltica, isto , cidados mais conscientes dos seus direitos e deveres tendem a ser mais proativos e comprometidos com os deveres cvicos ao lado do governo, atuando como coprodutores e fiscais das aes pblicas (Denhardt, 2012). Diante desse contexto, o objetivo da pesquisa consistiu em estruturar um ranking de transparncia dos portais legisl ativos dos maiores municpios brasileiros, tendo como objeto de estudo os portais eletrnicos de legislativos dos municpios brasileiros com populao superior a duzentos mil habitantes. Pressupe-se que as cidades com esse porte populacional possuem maiores condies tcnicas e financeiras para a estruturao de portais eletrnicos mais transparentes. Pressupe-se ainda que quanto maior a populao, maior a necessidade desse instrumento na comunicao entre governo e sociedade, pois o contato com os parlamentares em cidades maiores mais digital do que presencial, e as informaes passam a ser veiculadas nos portais eletrnicos (Pinho & Raupp, 2013).
Base da plataforma terica:
O conceito de accountability fundamental para o desenvolvimento desse estudo, pois discorrer sobre democracia, Estado e Novo Servio Pblico (NSP ) envolve necessariamente este conceito e toda sua complexidade. O modelo do NSP inspirado na teoria poltica democrtica, especialmente pela preocupao com a conexo entre cidados e seus governos possui como uma de suas premissas o reconhecimento de que a construo de accountability no algo simples (Denhardt & Denhardt, 2007). De modo geral, o estudo da gesto pblica com nfase no modelo do NSP faz referncia a uma administrao baseada na transparncia e coproduo do bem pblico (Denhardt & Denhardt, 2007; Salm & Menegasso, 2009). No contexto brasileiro, em decorrncia do estudo de Campos (1990) que o debate sobre accountability surge, abordando em especial a complexidade e as dificuldades para conceituar e traduzir a palavra na lngua portuguesa. Duas dcadas aps o estudo de Campos (1990), Pinho e Sacramento (2 009) tomaram como desafio a mesma questo, indagando se j era possvel uma traduo e definio semntica para a palavra accountability no cenrio brasileiro. A preocupao de Campos (1990) e de Pinho e Sacramento (2009) em buscar uma traduo e compreenso resultado da realidade sociopoltica e da necessidade de mecanismos de controle do poder poltico na recente redemocratizao do Brasil, hoje um pas democrtico jovem que continua tingido por traos patrimonialistas. Isso leva Pinho e Sacramento (2009, p.1348) a afirmar que “no existe um termo nico em portugus que defina a palavra accountability, tendo que trabalhar com uma forma composta”. Os autores apresentam uma definio geral de accountability como “a responsabilidade, a obrigao e a responsabilizao de quem ocupa um cargo em prestar con tas segundo os parmetros da lei, estando envolvida a possibilidade de nus, o que seria a pena para o no cumprimento dessa diretiva”. Diante da dimenso territorial e populacional dos Estados modernos e da complexidade envolvida nas questes polticas, as informaes pblicas devem ser consideradas fonte de poder e a transparncia e acesso s informaes uma condio necessria para o desenvolvimento de instrumentos de accountability (Rocha, 2011). A transparncia das informaes como pr-requisito para a vigilncia cidad e controle do poder uma questo que no pode ser pensada e planejada sem considerar a adoo de tecnologias de informao e comunicao (TIC) para que seja possvel a criao de fluxos de informao e comunicao de modo instantneo e interativo entre Es tado e sociedade (Fountain, 2005). Neste contexto, o governo eletrnico no deve ser considerado somente em termos de disponibilizao de servios online, deve, principalmente, ser considerado pelas suas possibilidades de estabelecer novos canais de transparncia e comunicao entre governo e sociedade. De fato o governo eletrnico possui “um enorme potencial democrtico, desde que haja definio poltica no sentido da participao popular e da transparncia, pois o governo pode deixar de oferecer o que no quer mostrar, para nem mencionar o que quer esconder” (Pinho, 2008, p.475). possvel observar que os portais eletrnicos ainda no fazem uso das TIC para “promover interatividade com a sociedade, sendo a ideia de interatividade e de explorao do potencial da comunicao, ainda praticamente inexistente” (Raupp, 2011, p.80) .
Mtodo de investigao:
A pesquisa empreendida descritiva, realizada por meio de um estudo de levantamento, com abordagem predominantemente qualitativa. A configurao populacional foi obtida por meio de consulta ao Censo Demogrfico 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) e os respectivos endereos eletrnicos dos portais das Cmaras Municipais foram acessados e catalogados mediante consultas ao site de pesquisa Google, realizadas nos dias 22 e 23 de janeiro de 2013 e 18 de abril de 2014. Diante do universo de cinco mil quinhentos e setenta municpios brasileiros, so cento e trinta e trs que apresentam a configurao populacional superior a duzentos mil habitantes, o que qualifica para essa pesquisa uma populao de cento e trinta e trs portais eletrnicos de Cmaras Municipais. Desta forma, foi elaborado um protocolo de observa o que agrupou dois conjuntos de indicadores, um deles elaborado com base nas diretrizes legais (LAI e Decreto n 7.724) e, o outro, para verificar instrumentos de transparncia no restritos s exigncias legais. Foram feitas visitas dirigidas aos portais para identificar a ocorrncia ou no dos indicadores estabelecidos no protocolo de observao de modo a descrever a situao emprica dos objetos analisados e, tambm, possibilitar transcrever notas reflexivas e consideraes que fossem relevantes. O protocolo de observao contemplou os elementos do modelo de anlise elaborado com base na proposta de Raupp (2011) para avaliar a adequao de portais eletrnicos s exigncias legais e, tambm, avaliar instrumentos de transparncia no restritos s exigncias legais. A partir da anlise dos portais, pde-se classificar a c apacidade dos mesmos da seguinte forma: (1) capacidade nula, quando o portal no possuir presena web ou no apresentar nenhum instrumento de transparncia exigido pela legislao; (2) capacidade baixa, nos casos de atendimento parcial s exigncias legais de transparncia impostas pela legislao; (3) capacidade mdia, nas situaes em que o portal apresentar atendimento completo s exigncias legais de transparncia; e (4) capacidade alta, quando o portal apresentar os instrumentos de transparncia exigidos pela legislao e outros instrumentos de transparncia no restritos s exigncias legais.
Resultados, concluses e suas implicaes:
O ranking dos legislativos mais transparentes considerou, primeiramente, a soma dos indicadores de transparncia decorrentes da exigncia legal. Em um segundo momento considerou-se a soma dos indicadores no restritos s exigncias legais. Nas primeiras posies do ranking encontram-se os portais eletrnicos dos municpios que apresentaram o maior somatrio dos indicadores de transparncia decorrentes da exigncia legal. Depois, como um critrio de desempate entre os portais com o mesmo somatrio destes indicadores, os municpios foram ordenados com base no somatrio da segunda categoria de indicadores de transparncia das informaes pblicas (no restritos s exigncias legais). Assim, o ranking resultou na classificao dos municpios em 52 posies, sendo os portais legislativos mais transparentes aqueles que cumpriram todas as exigncias legais e, sucessivamente, apresentaram o maior nmero de indicadores de transparncia do segundo conjunto (no restritos s exigncias legais). Os portais legisla tivos mais transparentes foram: na primeira colocao aparecem as cidades de Braslia (DF), Jundia (SP) e Gravata (RS). Na segunda posio esto as cidades de Curitiba (PR) e Novo Hamburgo (RS) e na terceira colocao aparecem as cidades de Feira de Santana (BA) e Caxias do Sul (RS). Os portais legislativos menos transparentes foram do municpio de Mag (RJ) (51 colocao) e dos municpios de Belford Roxo (RJ), Macap (AP), Paulista (PE) e Mossor (RN) (52 colocao). O diagnstico situacional das Cmaras Municipais reflete, de maneira geral, a necessidade de transformar as prticas de gesto da informao e a cultura organizacional nas Cmaras Municipais investigadas. A maioria dos portais analisados atendem parcialmente s exigncias legais. A qualidade da transparncia em termos de visibilidade e inferncia 33; baixa nesses instrumentos. So portais eletrnicos com suporte em recursos visuais que muitas vezes passam a falsa sensao de transparncia para o cidado: construdos com layouts elegantes, excessivos links de acesso s informaes de interesse pblico, inmeros recursos grficos, sistemas de busca com possibilidades de padronizao das pesquisas, mas, que no cumprem o requisito legal. O no cumprimento da exigncia legal evidencia um descaso dessas Cmaras Municipais com o princpio da transparncia e retrata a baixa efetividade da legislao. A “cultura do acesso” na gesto das organizaes pblicas investigadas ainda no configura uma realidade. Existem obstculos que ainda precisam ser superados para que os portais das Cmaras Municipais pesquisadas sejam efetivamente transparentes. Os achados do estudo r evelam a necessidade de transformao das prticas de gesto da informao e da cultura organizacional nos legislativos locais investigados. Do total investigado, 120 portais legislativos (90,22%) atenderam parcialmente s obrigaes legais. Outros 6 legislativos (4,51%) no apresentaram nenhum instrumento de transparncia em decorrncia da inexistncia de presena na rede mundial de computadores (internet); e somente 7 legislativos (5,26%) configuraram alta capacidade de transparncia das informaes pblicas, apresentando, alm das exigncias legais, outros instrumentos de transparncia que contribuem para aperfeioar a visibilidade e a inferncia das informaes pblicas. A quantidade de portais legislativos que atenderam menos da metade dos indicadores de instrumentos de transparncia restritos s exigncias legais tambm m ostrou-se significativa, correspondendo a 35 portais legislativos (26,31%). Quanto ao conjunto dos indicadores de instrumentos de transparncia no restritos s exigncias legais, evidenciou-se a margem de 42 legislativos (31,59%) que apresentaram menos da metade dos indicadores. O no cumprimento dos requisitos legais e a baixa presena de outros instrumentos de transparncia na maioria dos portais investigados sugere um descaso, intencional ou no, dos legislativos locais com o princpio da transparncia, e reflete a baixa efetividade da legislao, especialmente em sua dimenso enforcement.
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